2 de dezembro de 2009

Arruda


KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
Isso Também Fala Tudo:
Fonte:
“Ou dou um tiro na cabeça ou mato você”

“Durval e Arruda estavam – e ainda estão – num abraço de afogados. Agora, um empurra o outro para o fundo. Não há como escapar”

Há um trecho do inquérito 650-DF, que sustenta a Operação Caixa de Pandora, que chama muito a atenção. As páginas finais do calhamaço mostram como teve de ser interrompida a colaboração do ex-secretário de Assuntos Institucionais do Distrito Federal Durval Barbosa a partir do momento em que vazaram para o governador José Roberto Arruda (DEM) e os demais envolvidos as informações do processo.

Durval, como ele próprio diz em seus depoimentos, já gravava Arruda e outras pessoas do governo antes mesmo de fazer o acordo de delação premiada com o Ministério Público. E fica claro que Arruda já sabia disso. Num dos depoimentos de Durval, ele conta um momento em que conversa com o governador sobre isso. E é esse trecho específico que nós vamos avaliar. Arruda diz a Durval o seguinte, segundo o relato do ex-secretário: "Se você apresentar essas imagens da minha pessoa, você me avise com cinco dias de antecedência que é para eu sumir ou dar um tiro na minha cabeça ou te matar”.

Certamente, era um esforço de retórica de Arruda. Afinal, Durval continuou a gravá-lo. Entregou tudo para a polícia e não avisou Arruda com antecedência quando as coisas estouraram. Desde sexta-feira (27), o governador está fechado em copas, mas não fugiu, não deu um tiro na cabeça nem matou ninguém.

Se as coisas se deram mesmo como narrou Durval, a frase é reveladora de vários aspectos de como se daria, então, a relação de Arruda com esse seu secretário. Primeiro, a compreensão da gravidade do que fora gravado por Durval, algo capaz de fazer com que Arruda pensasse em “dar um tiro na cabeça” ou matar alguém. Mas, principalmente, explica no que se baseava o relacionamento dos dois.

Já corria em Brasília há algum tempo a informação de que Durval, delegado, se valia da estrutura da inteligência da Polícia Civil para monitorar todas as pessoas com poder no governo do Distrito Federal. Era de posse dessas informações que ele se mantinha. Sua passagem pela presidência da Companhia de Desenvolvimento do Planalto (Codeplan) lhe rendera várias ações na Justiça. O que se comenta é que Durval buscava no governo Arruda ter um cargo de secretário, como conseguiu, para obter foro privilegiado para responder a esses processos.

Durval, logo no início do inquérito, fala que a sua motivação para colaborar com a polícia deu-se no início do governo quando descobriu que Arruda montara uma operação para que o jornal Correio Braziliense fizesse reportagens denunciando-o para desmoralizá-lo. Durval diz que, então, conseguiu evitar a operação. Como? Lembrando a Arruda de tudo o que tinha contra ele.

Ou seja, àquela altura, Durval já tinha há muito deixado de ser um homem de confiança de Arruda. O governador se via obrigado a aturá-lo, por força da chantagem que Durval fazia.

Resta, porém, uma coisa que, à primeira vista, não parece bater nessa história: se era essa a relação entre Arruda e Durval, por que Arruda ainda destinava ao ex-secretário de Relações Institucionais a tarefa de recolher dinheiro público desviado para o seu esquema, algo que deveria ser feito por alguém da sua absoluta confiança? Alguns aliados de Arruda têm batido, em conversas informais, nesse ponto para tentar montar a versão de que o esquema seria de Durval, e não de Arruda.

Há, porém, quem tenha outras explicações. E elas, dado o que aparece nos vídeos e conversas gravadas, parece fazer muito mais sentido que a versão edulcorada dos aliados de Arruda. Foi com Durval, ainda no governo Roriz, em 2003, que Arruda combinou o esquema. Quem sabia mover as engrenagens para que ele funcionasse era Durval. Arruda não tinha, assim, como se livrar completamente dele. Precisava confiar na ideia de que Durval era uma figura desconfortável por esse hábito de gravar todo mundo, mas que fazia isso para manter a sua posição, não para detonar tudo em algum momento.

E o inquérito mostra em vários momentos que Arruda trabalhava para, pelo menos, diminuir a dependência de Durval para a manutenção do esquema. Havia o que Durval chama de “pulverização” do esquema, ou seja, várias pessoas recolhendo dinheiro em várias frentes. Comenta-se da falta de controle provocada por essa pulverização. Durval fala, por exemplo, que haveria uma operação para o secretário de Saúde, Augusto Carvalho, feita por Fernando Antunes, subsecretário, que não estaria sendo monitorada. Quando tais coisas são comentadas, num diálogo gravado, Arruda determina que a centralização passasse a ser feita pelo chefe da Casa Civil, José Geraldo Maciel.

Enfim, dado o envolvimento, Arruda não tinha alternativa senão, na melhor das hipóteses para ele, ir se livrando de Durval aos poucos. E, aparentemente, era isso o que ele vinha tentando fazer. Tentara, no começo do governo, criar uma situação que justificasse afastar Durval e não conseguira.

Durval e Arruda estavam – e ainda estão – num abraço de afogados. É por isso que Arruda, mesmo sabendo que era gravado, mesmo tendo Durval mais como um estorvo, não podia se livrar dele. Nem tirar dele as tarefas habituais de recolhimento de dinheiro público. Enquanto tinham a cabeça à tona, um ajudava o outro a não afundar. Agora, no desespero dos afogados, um empurra o outro para o fundo. Não há como escapar.


*É o editor-executivo do Congresso em Foco. Formado em Jornalismo pela Universidade de Brasília em 1986, Rudolfo Lago atua como jornalista especializado em política desde 1987. Com passagens pelos principais jornais e revistas do país, foi editor de Política do jornal Correio Braziliense, editor-assistente da revista Veja e editor especial da revista IstoÉ, entre outras funções. Vencedor de quatro prêmios de jornalismo, incluindo o Prêmio Esso, em 2000, com equipe do Correio Braziliense, pela série de reportagens que resultaram na cassação do senador Luiz Estevão

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